Sobre morar com gringo e identificação cultural

Como vocês sabem, eu moro com dois espanhóis e uma irlandesa. Nós nos damos super bem, mas depois de quase 6 meses morando com eles, eu agora olho o “morar com gringo” com olhos bem diferentes.

Vou explicar o por que.

Já citei aqui no blog algumas vezes que existe um número razoável de espanhóis em Sligo, a maioria au pairs que, como de se esperar, andam todos juntos. No meu primeiro mês em Sligo, eu conheci duas dessas au pairs espanholas, que acabaram me apresentando para o o grupo de espanholas e espanhóis que elas haviam acabado de conhecer e que, assim como nós, eram também novos em Sligo.

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Nós saímos algumas vezes e um grupo se formou. Um grupo que eu fiquei de fora. Como na época eu morava longe do centro e ainda estava bastante encantado com a minha vida nova, eu nem percebi que eu estava “fora do grupo”. Dava as caras nos rolês quando me chamavam e nunca tive problemas, sempre fui bem tratado e me diverti.

Meses depois, eu me mudei pra essa casa, com dois dos espanhóis que fazem parte desse grupo de espanhóis. Desde então, percebi que minha casa é o hub de encontro da comunidade espanhola de Sligo.

Eles estão sempre aqui, fazem tudo aqui e tomam conta da casa. É deles.

A garota irlandesa tem o grupo de amigos irlandeses dela e está sempre “out and about” com eles, mas quando ela está em casa em dia de reunião espanhola (todo fim de semana), assim como eu, ela tem que ficar trancada no quarto.

É aqui que eu entro no assunto de identificação cultural, pois eu sinto que pelo simples fato de eu não ser espanhol (ou não falar espanhol) e não entender as piadinhas, papos, fofocas, músicas e etc que rolam na Espanha, eu não posso participar desse grupo.

A galera que vem pra Irlanda, sempre tem o mesmo papo de “quero sumir de brasileiros”, “não quero ter contato com os brasucas”, “quero ter poucos amigos brasileiros” e etc. Acreditem, os espanhóis tem o mesmo discurso, mas que na prática não rola.

Mesmo que, dos 15 alunos da sala, 10 sejam brasileiros, ainda existem 5 “gringos” ali, não existem? Com quantos deles você vai de fato tentar fazer amizade e ser próximo? Não é muito mais fácil trocar ideia com o brasuca que entende as músicas da Anitta, as piadas ridículas do Faustão e fala mal da novela das 8?

Foi isso que eu percebi no grupo de espanhóis daqui. Eles preferiram muito mais formar uma comunidade espanhola do que abrir as portas pra gente (eu) de outras culturas.

Hoje, eu super os entendo e acrescento que, se eu estivesse próximo de uma comunidade brasileira, eu acabaria fazendo a mesma coisa. No fundo, o que a gente quer é ter contato com o povo local e fazer alguns poucos e bom amigos (hi guys!), mas não tem como fugir…aquele grupo grande, da zuera, das confidências, das conversas às 04h da manhã, das gafes na lanchonete, das viagens malucas, vai sempre ser o nosso povo.

Demorei um pouquinho pra aprender essa lição, mas os espanhóis me ensinaram.

E antes que vocês aleguem que morar com gringo melhora o inglês blá blá blá, eu te digo: estuda e pratica que melhora.

Por mais que eu fale inglês, que eles falem inglês, que você fale inglês, a comunicação na sua língua e a identificação que você cria com alguém que também a fale é sempre mais legal.

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7 comentários sobre “Sobre morar com gringo e identificação cultural

  1. Que triste… lembro da minha vida de au pair nos EUA e tudo isso que vc escreveu se aplicava lá também. As au pairs brasileiras andavam juntas, as alemãs andavam juntas, as hispânicas andavam juntas… a gente até tentava se relacionar com au pairs de outras nacionalidades (no começo, fiz amizade com panamenhas, sul-africanas, mexicanas, argentinas), mas no fim das contas, a gente corre mesmo pras brasileiras porque chega uma hora que enche o saco falar inglês o tempo todo, que você sente falta daquele calor brasileiro, enfim, de tudo isso que você comentou. A diferença é que quando eu era au pair, não tinha essa coisa de “não vou fazer amizade com brasileira”, até porque a gente já ficava exposta ao inglês uma boa parte do dia convivendo com a hostfamily.

    1. Oi, André…então, as cidades pequenas não são destinos de brasileiros da pegada “curso de inglês”, mas graças ao Ciência Sem Fronteiras, praticamente todas as cidades irlandesas com universidades (Galway, Cork, Limerick, Waterford, Wexford, Dublin, Athlone e Sligo) tem um número razoavel sim. Em Sligo tem um grupo de quase 100, mas eles moram perto da univ e, por estarem em um grupo grande, não se misturam muito..ficam mais entre eles..

  2. Rick, eu entendo perfeitamente o que você quer dizer. Por mais que amizades gringas sejam legais, a gente se identifica mesmo com os nossos, não tem jeito. É mais fácil pra nos comunicarmos na nossa língua, é mais cômodo e natural ter as mesmas referências que nossos compatriotas. Uma pena que os espanhóis não te deram essa abertura (embora a gente compreenda o motivo)…

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